A atriz Revelação Julianna Gerais e um papo sobre presente e futuro no cinema, streaming e teatro

por | novembro 10, 2023

“A Batalha da Rua Maria Antônia” narra um momento emblemático dos tempos da ditadura militar no Brasil. Um conflito entre professores e estudantes no prédio da Faculdade de Filosofia da USP, que  queriam garantir a votação no pleito do movimento estudantil, tiveram de enfrentar os ataques do Comando de Caça aos Comunistas vindos do outro lado da rua, da Universidade Mackenzie.

Foi através deste trabalho que conheci o talento de Julianna Gerais, atriz de 26 anos formada em Artes Cênicas pela tradicional Escola Superior de Artes Célia Helena, além de também ter  cursado a Escola de Artes Dramáticas da USP. A artista considera o trabalho feito no longa de Vera Egito um dos mais divertidos da carreira até aqui, e também um dos mais desafiadores. “Nesse recorte ali da ditadura que aconteceu no centro de São Paulo, na rua Maria Antônia, foi muito especial. Fiz uma personagem muito legal, sabe? Ela me exigiu um trabalho diferente  de voz e de corpo, isso foi incrível. E fazer o filme, estar nos sets dos filmes, eu realmente acho que é uma experiência que eu não sei se repete na vida, sabe? Porque a gente gravou em película, preto e branco, em 21 planos-sequências. É assim, babado”, relembra sorrindo.

Julianna Gerais em ‘A Batalha da Rua Maria Antônia’ (Crédito> Rafa Barion)

 

Não é sempre que um longa-metragem nacional usa o artifício do plano sequência (cena longa e sem cortes). Gravações do tipo exigem muito ensaio e concentração do set inteiro, mas quem foi treinada em teatro como Julianna, o desafio foi familiar. “A película, ela é isso: gravou, errou, você perdeu a película. Então a gente chegava, gravava, gravava, gravava, três chances pra rodar e era uma orquestra, né? Uma grande dança. E aí tinha uma coisa que era muito semelhante ao teatro que você tinha que estar viva o tempo todo, não tinha ‘Ah, a câmera não tá em mim, tô em outra coisa’, a câmera podia voltar em mim a qualquer momento”.

Uma obra como essa parece ainda mais urgente quando pensamos no atual momento político do Brasil, vivendo sob ameaças constantes contra a democracia e políticos extremistas adorando uma época tão dura quanto a ditadura militar brasileira. “A ditadura parecia algo já superado. Então, assim, quando a gente gravou, que foi ano passado, início de 2022, época de eleição no Brasil, né, pós-pandemia, um governo que sabemos como foi, o filme se torna mais emblemático, mais urgente do que nunca. É isso, uma bandeira de ditadura nunca mais”, aponta Julianna.

Divulgação

 

Se no cinema, a atriz viveu essa experiência premiada, na TV, ou mais especificamente no streaming, ela é uma das protagonistas de “Últimas Férias” , nova série nacional de drama investigativo da Star Original Productions, realizada pela IntroPictures. Na produção, que entrou em cartaz esta semana, Julianna é Inês (Julianna Gerais), integrante de um grupo de amigos que tem a viagem de férias surpreendida por uma tragédia.  Malu (Lara Tremouroux), Luiz (Filipe Bragança) Bruno (Ronald Sotto), Marcos (João Oliveira), Eric (Michel Joelsas), Ana (Luana Nastas) e Inês precisam lidar com a corrosão da relação entre eles enquanto tentam desvendar um assassinato. Essa série também foi muito especial. O elenco principal, os sete protagonistas, foram muito bem escolhidos, porque eles são jovens dentro de uma série densa. Mistura essas roupagens de coisa adolescente e história densa. Cada personagem ali tem a sua trama, seu arco dramático”.

Tem uma coisa do teatro que é junto com a precariedade no audiovisual, por exemplo, ele é muito segmentado, né, a galera da câmera, a galera do figurino, arte e tal. Essa precariedade faz com que você tem que aprender a fazer meio que tudo, sabe? No teatro, acho que você é muito autor junto, o cinema é mais hierárquico nessa questão. Até porque a era dos streamings traz uma coisa que é: o canal escolhe tudo. Não é mais o diretor, né, é o canal que dá o aval final – Julianna Gerais

 A personagem virou uma queridinha para a atriz. Segundo Julianna, Inês reflete um pouco da energia e da busca por liberdade que ela mesma busca em sua vida pessoal. “Apesar da curva dela na série, né, em algum momento Inês sofre um abuso muito complexo, que eu acho uma grande coisa ali no roteiro e da minha personagem, ela traz uma sexualidade muito livre, muito mais livre do que a galera ali da série, sabe? Lá no primeiro episódio ela tátransando com uma garota e também fica com o Goés, não é uma questão, sabe, ela flerta na performance dela com algo talvez não tão cis, muito livre mesmo”, explica.

 

Não é o primeiro papel de destaque de Julianna em uma plataforma de streaming. Ela viveu Maia na série da HBO “Todx Nox”. Cada vez mais esta é a opção para atores e atrizes que querem escoar seu talento para além do disputado filtro da TV. Ju não esconde que gostaria de fazer novela, alcançar um público diferente do que acompanha cinema e streaming, mas está muito satisfeita com os rumos atuais da carreira. Inclusive está gravando uma nova série, mas ainda não pode revelar muito. “Posso falar só um pouquinho. A série se chama “Dias perfeitos” e é de um livro do Raphael Montes, que escreveu “Bom dia, Verônica”, né, o livro “Bom dia, Verônica”. Série de psicopata, é tudo o que eu posso dizer”, diz aos risos.

Com filme já gravado a ser lançado (“Treze Sentimentos”), uma série em processo de filmagem, e possível volta ao teatro, ainda ouviremos falar bastante de Julianna Gerais. Admiradora da base que o teatro dá, ela tem levado essa bagagem para os papéis no audiovisual como forma de reverência à formação que teve. 

Ela evita panfletagem sobre ser uma atriz negra ocupando espaços porque já sabe que sua existência nesse meio é uma forma de militância e julga que verbalizar o tempo todo acaba sendo uma forma de gastar energia com algo que nem sempre exige explicações. Julianna Gerais sabe onde vai chegar sendo quem é.

 

0 comentários


– ÚLTIMOS VIDEOS –


– ÚLTIMAS NOTÍCIAS –