Exu brilhou no desfile das escolas de samba e abriu os caminhos para o carnaval carioca chegar aos palcos. O tema não poderia ser mais icônico: o trabalho dos geniais Joãosinho Trinta e Laíla, carnavalesco e diretor de carnaval no emblemático desfile da Beija-Flor de Nilópolis em 1989, com o enredo “Ratos e urubus, larguem minha fantasia”. O maior desfile da história do carnaval do Rio de Janeiro transforma a Arena do Sesc Copacabana, no Rio, na Praça da Apoteose com o espetáculo “Joãosinho & Laíla: Ratos e Urubus, larguem minha fantasia”, a partir da próxima quinta, dia 9, em temporada que vai até 3 de julho, com sessões de quinta a domingo, às 19h.
Todo aquele universo revolucionário de moradores em situação de rua reais entre pessoas fantasiadas como eles, com a réplica da estátua do Cristo Redentor – em farrapos – coberta por um plástico preto, que tantas reflexões levaram ao público que lotava a Marquês de Sapucaí, onde fica o sambódromo, chega agora ao teatro provando o quão importante é o carnaval para a quebra de paradigmas, a desconstrução de preconceitos, e para a formação da cultura e dos valores de um povo.
A ideia surgiu de uma conversa de Édio Nunes, diretor da peça, que participou do histórico desfile, com o coreógrafo de comissão de frente Patrick Carvalho. É forte a memória daquele carnaval. “Jamais esqueci a cena em que nós, os mendigos, arrancávamos o plástico preto (desfile das campeãs) que cobria a réplica da estátua do Cristo Redentor, um Cristo mendigo, que havia sido censurado pela Igreja e execrado pela mídia. Durante o desfile, a gente foi arrancando aquele plástico, desvelando aquele Cristo, provocando uma comoção. Essa memória me veio conversando com meu amigo Patrick, sobre Laíla e Beija-Flor. Fui percebendo que havia ali um espetáculo. Resolvi, então, levar para o palco aquela memória tão viva dentro de nós, aquele desfile que foi um divisor de águas. Levar para o palco atores e músicos com o candomblé na veia, levar o luxo e o lixo, arrancando o plástico da censura e pedindo para que o Cristo Oxalá – assim o chamo – continue olhando por nós, pelos que sofrem injúria racial e com o racismo estrutural, pelas mães negras que perdem seus filhos, pelas crianças negras que morrem diariamente; por todos nós, negros, macumbeiros, gays, indígenas, todos os diminuídos pela sociedade brasileira. Que olhe por nossa cultura, por nossos artistas. E que esse espetáculo abençoe todos nós”, exalta Édio.
O polêmico enredo – que sacudiu a sociedade com um profundo debate sobre a secular questão da desigualdade social no país – tinha por trás os incríveis Joãosinho Trinta e Laíla. Geniais e geniosos, os dois construíram uma trajetória de produção criativa e campeã, e uma relação pessoal repleta de admiração recíproca, de um lado, e de conflitos e embates entre temperamentos e vaidades, de outro.
O texto é assinado por Márcia Santos. Ela observou que, este ano, uma escola de samba vencera o carnaval carioca levando para a avenida os diversos aspectos de Exu, arquétipo e entidade da religiosidade africana, confirmando a importância do carnaval na desconstrução de preconceitos, na formação de conhecimento e na divulgação de valores históricos. “Joãosinho e Laíla são, com certeza, dois dos responsáveis pela construção do espaço de transgressão e de irreverência que tem a arte, essa poderosa ferramenta social e política”, explica Márcia, cujo texto vai mostrar traços da personalidade de Joãosinho e Laíla, assim como os bastidores do desenvolvimento de um desfile, figuras e elementos do universo carnavalesco. “Minha sensação é de que, em sincronia com o tempo, nossa montagem chega na hora certa e crava, no seio da zona sul carioca, um pouco da história do carnaval e da comunidade de Nilópolis”, conclui a autora.
Em cena, Wanderley Gomes e Cridemar Aquino dão vida a Joãosinho e Laíla, respectivamente; enquanto Ana Paula Black e Milton Filho desdobram-se em diversos papéis. Junto com os três músicos em cena – Fábio D’Lélis (percussão), Leo Antunes (cavaquinho) e Marlon Jr (violão) – o elenco conta a história daquele desfile e seus personagens e leva ao público um pouco da dinâmica dos bastidores do carnaval, a rotina dos barracões, os sambas de enredo e as figuras que compõem esse universo.
A montagem propõe render sua homenagem ao samba e a essas relevantes figuras do carnaval carioca, cujas vidas fazem parte da história da cidade do Rio de Janeiro e, em extensão, da história do país, dada a importância deste patrimônio cultural popular e histórico que é o carnaval do Rio de Janeiro, além de percorrer por acontecimentos de grande comoção midiática entre os anos de 1989 e 1990. Oito sambas enredo costuram a cronologia do espetáculo.
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