“1300° Qual é a saúde de um vulcão?”, espetáculo que cria paralelo entre a força dos vulcões e as relações humanas

por | maio 15, 2025

Através de movimentos corporais intensos, a artista mineira Malu Avelar investiga as tensões entre o ser humano e sua capacidade de se transformar. Este é o pano de fundo do espetáculo “1300° Qual é a saúde de um vulcão?”, que fica em cartaz no Teatro Sesc Tijuca, entre os dias 29 de maio e 1 de junho.

A peça, produzida pela Alakoro Produções e contemplada no Edital de Cultura Sesc RJ Pulsar, aborda as interações entre a força dos vulcões e as estruturas sociais humanas, refletindo sobre como a destruição e o atrito podem, paradoxalmente, promover regeneração e saúde. Segundo a artista, a montagem propõe uma descolonização do corpo que transcende as fronteiras entre humanidade e monstruosidade.

“No espetáculo, essas tensões se manifestam por meio de movimentos corporais intensos, levantando reflexões sobre o corpo e sua capacidade de transformação. O humano tende a ver o vulcão como um monstro porque, em erupção, ele foge ao controle e deixa de ‘servir’. No entanto, é justamente nesse gesto de destruição que o vulcão expõe a necessidade de explosão como parte do processo de renovação. A erupção, com sua força deformadora, desafia nosso conceito de saúde, pois a humanidade, como a entendemos, resiste ao disforme”, analisa Malu Avelar

Ela completa, ainda, reafirmando que tragédia só existe porque a destruição atinge o humano. “Quanto mais nos apegamos a essa condição, mais nos aproximamos da ruína. O trabalho propõe uma descolonização do corpo, ultrapassando os limites entre humanidade e monstruosidade, sugerindo ser necessário imaginar o corpo além do humano, acolhendo o caos como força regenerativa”, acrescenta.

Utilizando a energia vulcânica como metáfora e o manuseio da argila como símbolo, a obra sugere que a saúde é um processo dinâmico, que atravessa a destruição e a renovação, onde o humano se fragmenta e se reconstrói, acolhendo o caos como fonte de vitalidade. Ainda de acordo com Malu Avelar, nesse contexto, o corpo é uma entidade mutável, moldada pelas forças que o atravessam. Como a lava que reconfigura a terra, a energia vulcânica é metáfora para reconstrução: a saúde não é um ponto de chegada, mas um caminho de destruição e renovação.

“Durante o espetáculo, o uso da argila reflete esse ciclo, onde a matéria se desfaz para se recompor. Inspirada por mitologias que associam o barro à criação humana, a peça trata o humano como fragmento, pedaços que trazem em si o potencial de renascimento. Desta forma, a destruição abre espaço para novas perspectivas de saúde, vista como algo dinâmico, que emerge do conflito e da transformação”, explica a artista.

Malu Avelar ainda reflete sobre a metáfora do vulcão e afirma que esse comparativo pode mudar a imaginação de quem assiste ao espetáculo. Segundo ela, o paralelo pode trazer uma percepção de conexão de dentro de si em relação à sociedade e ao planeta para o público.

“A mudança vem na forma de ver como que nos conectamos e como percebemos que a estamos condicionados fisicamente, corporalmente, a nos mover apenas de uma forma, ao dar atenção apenas a determinadas coisas. E que isso tudo faz parte de uma construção da própria humanidade. Então, quando quebramos essa percepção, tentamos olhar para dentro, começamos a sentir essa vibração, essa conexão com espaço, com as pessoas, com a diversidade, com terra”, reflete.

“A partir do momento dessa conexão, trazer essa metáfora pode nos ajudar a repensar processos coletivos, a entender nosso corpo de outra forma, porque a partir do momento entendemos a conexão de outra forma, entendemos como pensamos coletivamente”, completa a artista.

Depois de seis anos de pesquisa e algumas apresentações na cidade de São Paulo, esta é a segunda  vez que 1300º sai para apresentações em outros territórios, e Malu celebra o feito, afirmando que a expectativa com as apresentações é grande para toda equipe e não só para ela.

“Estamos muito emocionados com tudo, com uma expectativa imensa que o público chegue, que consigamos a plateia cheia e que todos tenham curiosidade de chegar junto e compartilhar desse momento comigo e com todos que fazem parte desse processo”, comenta.

A experiência durante sua estadia na Alemanha trouxe à artista vivências intensas de enfrentamento ao racismo, presentes desde o primeiro dia. Situações cotidianas, como abordagens nas ruas e a presença constante da polícia, revelaram questões já familiares no Brasil, mas que ali emergiram de modo mais incisivo.

 

“Minha percepção corporal se expandiu, me fazendo sentir-se como um corpo à beira da explosão, com a sensação de fragmentos que poderiam se espalhar e depois ser reunidos. Surge, assim, a ideia do ‘corpo-bomba’: não como destruição, mas como expressão da pressão de existir em um corpo negro, latino e LGBTQIA+ em constante tensão”, pontua Malu Avelar.

Assim, 1300° Qual é a saúde de um vulcão? aborda o antropoceno e a necessidade de repensar as relações interespécies. Ao questionar as fronteiras entre humano e monstruoso, a obra convida à reavaliação de nossas práticas de cuidado e saúde em escala planetária, refletindo sobre colapso ambiental, racismo e a urgência de uma ética que acolha o imprevisível e o incontrolável.

 

“O vulcão, com sua força destrutiva e regeneradora, desafia a visão antropocêntrica, propondo uma coexistência integrada com outras formas de vida”, finaliza a artista.

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