Hamlet é confrontado em Black Machine, peça sobre humanismo e papéis de gênero

por | setembro 11, 2025

Buscando discutir o legado de Hamlet, de William Shakespeare, e sua influência até os dias de hoje, o espetáculo BLACK MACHINE propõe um encontro do personagem do dramaturgo inglês com a Ofélia de Heiner Muller, da obra Hamlet Machine (1972). Contemplada na 20ª edição do Prêmio Zé Renato – Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa, a peça estreia no dia 11 de setembro, às 20h, na Casa do Povo, onde realiza dez apresentações, até o dia 28 de setembro. Depois, segue para mais 10 sessões na Casa Farofa (Rua Treze de Maio, 240, Bela Vista, São Paulo).

Com dramaturgia de Dione CarlosFernando Lufer e Eugênio Lima, o trabalho é dividido em três partes. A ideia é promover um embate radical entre esses dois grandes cânones do teatro ocidental, aproveitando para confrontar temas como gênero, raça, necropolítica, masculinidade, dor e desejo.

“Para mim, o texto é uma discussão de gênero com pitadas de melodrama”, conta Dione. E, para garantir o caráter atemporal da obra, os dois personagens centrais são pós-coloniais. Enquanto Hamlet é atravessado por vozes como as de Frantz Fanon, Jean-Michel Basquiat, Aimé Césaire e Mano Brown, Ofélia é inspirada por nomes como Lélia Gonzalez, Sueli Carneiro e Erykah Badu.

“A grande brincadeira de Black Machine é que, na verdade, os personagens clássicos estão tentando ser atores. Só que eles “incorporam” em corpos negros em pleno século 21 e nós estamos investigando quais seriam as implicações disso”, comenta Eugênio.

Sobre a encenação

Durante a encenação, que se alterna entre delírio, manifesto e performance, Ofélia desafia Hamlet a assumir outro papel. “Pensamos nisso porque há 400 anos ele só fala dele mesmo. Nesse ponto da narrativa, Fanon ganha mais destaque, desdizendo tudo o que foi dito antes”, explica Lima.

Por apresentar ao público um embate que atravessa eras, o diretor Eugênio Lima, define a peça como um experimento polifônico. Em meio a provocações filosóficas e referências políticas, os personagens expõem as ruínas do patriarcado enquanto constroem suas identidades.

HAMLET – “Minha mãe, seus seios, um roseiral. Seu ventre, um ninho de víboras”.

OFÉLIA  – Ah, pelo amor de Deus. Busca ajuda, isso é mais antigo que Édipo e Jocasta.

HAMLET – Sua sinceridade é desconcertante. Como eu pude deixar você escapar?

OFÉLIA – Você estava muito ocupado com você mesmo, enquanto eu perdia meu tempo contigo. Estive lá, ‘sob o sol da tortura’ de amar o homem errado, duas vezes.

HAMLET – Duas vezes? Achei que eu tivesse sido o primeiro.

OFÉLIA – Nem o primeiro, nem o último, no meio do “coração das trevas” de uma mulher que ama demais sempre cabe mais um.” Trecho da dramaturgia de Black Machine

Para os realizadores, a questão central é: será que todo mundo pode realmente se identificar com o dilema existencialista do Hamlet sobre a dor de estar vivo?

“Fato é que a população negra nem sempre é vista como ‘ser’ e, talvez, tudo que a gente mais queira seja poder não ser mesmo. Assim, abre-se um mundo de possibilidades. Não queremos nos limitar: por que uma mulher branca pode dizer que é apenas uma mulher e uma mulher negra sempre deve se definir como mulher negra? Da mesma forma, não quero fazer teatro negro, quero fazer teatro”, defende Eugênio.

A montagem segue a estética do audiovisual expandindo, com destaque para a música constante e a presença de uma videografia projetada dividida em três telas em frequente diálogo com as dramaturgias sonora e textual. Em cena, Fernando Lufer e Marina Esteves performam seus textos flertando com a linguagem do spoken word em diversos momentos.

A montagem aposta em um visual afro-surrealista, mesclando passado, presente e futuro. Todos os tempos acontecem simultaneamente, expondo as feridas, evocando ancestralidades e construindo uma nova realidade.

Sinopse

Em um embate radical com os cânones do teatro ocidental, Black Machine reinventa Hamlet e Ofélia numa peça pop. Ele é um Hamlet pós-colonial, atravessado por vozes de Frantz Fanon, Jean-Michel Basquiat, Aimé Césaire e Mano Brown. Ela é uma Ofélia insurgente, construída a partir de Lélia Gonzalez, Sueli Carneiro e Erykah Badu.

Em um espaço entre o delírio, o manifesto e a performance, os dois personagens criam um  “debate de gênero com pitadas de melodrama” confrontando, raça, necropolítica, masculinidade tóxica, dor e desejo — enquanto expõem as ruínas de um mundo reconstroem suas identidades em pleno palco.

Feita de estilhaços poéticos, provocações filosóficas e camadas de referências políticas, a peça é um experimento polifônico em que o clássico é atravessado pelo presente: da colonização à globalização, das dores íntimas à violência sistêmica. Hamlet e Ofélia se enfrentam, se provocam, se reinventam — e, ao fazer isso, expõem o mundo em que vivem.

 

FICHA TÉCNICA

Idealização: Fernando Lufer

Direção Geral: Eugênio Lima

Concepção: Fernando Lufer e Eugênio Lima

Intérpretes: Fernando Lufer e Marina Esteves

Dramaturgia: Dione Carlos

Intervenção Dramatúrgica: Eugênio Lima e Fernando Lufer

Produção: Umbabarauma Produções Artísticas

Coordenação de Produção: Iramaia Gongora

Assistente de Produção: Thaís Cris

Assistente de Direção: Rafa Penteado

Direção Musical: Eugênio Lima

Figurino: Claudia Schapira

Videografia: Vic Von Poser

Iluminação: Matheus Brant

Direção de Movimento e Preparação Corporal: Luaa Gabanini

Spoken Word: Roberta Estrela D’Alva

Dramaturgismo: Luz Ribeiro

Engenharia de Som: João Souza Neto e Clevinho Souza

Intérpretes de Libras: Ricieri Palha e Vinícius Nascimento

Fotos: Sérgio Silva

Redes Sociais: Jorge Ferreira

Assessoria de Imprensa: Canal Aberto – Marcia Marques, Daniele Valério e Carina Bordalo

Costureira: Cleusa Amaro da Silva Barbosa

Apoio: Casa do Povo e Casa Farofa

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