Os roteiros de séries nas mãos de mulheres pretas: Conheça Renata Andrade e Thais Pontes, autoras de ‘Encantado´s’

por | julho 25, 2023

Os irmãos Olímpia  e Eraldo (interpretados por Vilma MeloLuís Miranda) herdam do pai um empreendimento familiar que, durante o dia é um supermercado, e à noite se torna a quadra da escola de samba Joia do Encantado. Este é o plot de “Encantado´s”, série divertidíssima que trouxe muita pretitude nas telas e que tem um de seus grandes segredos de sucesso e qualidade o trabalho feito atrás das câmeras, com Thais Pontes e Renata Andrade sendo as responsáveis pelo roteiro da série.

Além do bom texto, as autoras acertaram no casting, trazendo nomes conhecidos e outros em ascensão para encarnar cada uma das figuras ímpares da produção. “Foi muito gostoso o processo de descobrir, a cada teste, que tínhamos achado a atriz e o ator que dariam vida àqueles personagens. A Dandara Mariana também fez teste, mas eu e a Thais já tínhamos ela em mente desde 2018, quando criamos a série. No pitching que fizemos para empresa na época, produzimos um encarte de supermercado para apresentarmos a história e os nossos personagens. Desde aquela época, Dandara já era a nossa Pandora”, conta Renata sobre a escolha da atriz Dandara Mariana.

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.”Confesso que antes dos testes, bateu um pouco de medo do peso dessas escolhas: e se a gente não tiver certeza? E se não encontrarmos as pessoas certas? E se escolhermos e depois não der certo? Eram muitas dúvidas, mas todas foram sanadas assim que os testes começaram a chegar. A gente assistia e, de cara, tinha certeza de que aquele ator ou atriz era exatamente o que queríamos e precisávamos para contar essa história. Rolou um match muito especial. As dúvidas viraram certezas. Temos o nosso dream team”, reforça Thais Pontes.

Thais Pontes e Renata Andrade  são amigas há 25 anos e, a convivência pessoal e profissional, ( as duas fizeram juntas oficina de humor para roteiristas negros da TV Globo) se reflete na coesão e fluidez do trabalho da dupla carioca.Naquela época, não sabíamos sobre valores de produção, planilhas de orçamento e tudo mais. Criamos sem amarras ou limites e isso foi fundamental na construção do que apresentamos. Claro que a experiência que eu tenho hoje e que adquiro dia a dia é fundamental para o meu trabalho, mas não quero perder o olhar fresco na hora criar. O projeto foi aprovado para desenvolvimento, começamos a trabalhar nele e em 2020 ganhamos dois reforços incríveis no projeto: Antonio Prata e Chico Mattoso, que entraram como roteiristas e redatores finais da série”, explica Thais.

Conheça Renata Andrade e Thais Pontes, autoras que estreiam na TV com 'Encantado's', do Globoplay

Renata Andrade e Thais Pontes (Imagem: Divulgação)

Thais e Renata fazem parte de um movimento precioso encabeçado por mulheres pretas, que tem transformado a cara do audiovisual brasileiro. Suas experiências e escrevivências são traduzidas em uma assinatura única que traz frescor para nossa TV.

Confira mais do nosso papo com elas!

“Encantados” é uma série leve, que apesar dos conflitos surgidos entre os personagens, mantém a trama flutuando para um lado lúdico. Foi proposital fugir de narrativas mais conflituosas envolvendo personagens negros?

Thais Pontes:  Com certeza. Antes de qualquer coisa, o Encantado´s é uma comédia e esse foi o nosso ponto principal. Queríamos fazer o básico, que é “normalizar” a presença dos corpos negros na tela para além das narrativas já conhecidas e tão limitantes. Por muito tempo, fomos representados nos mesmos lugares: a violência, o escravizado, a empregada doméstica, o corpo objetificado. É claro que é muito importante falar das nossas mazelas, mas no Encantado’s a gente quis virar o foco e mostrar que não somos só dor. Pelo contrário, nós somos plurais. A série fala de amor, de fé, de família, de relações de trabalho, de festa. É muito importante a criação de novos imaginários e acho que, de alguma forma, o Encantado’s cumpre esse papel, sempre com o foco no humor.

Renata Andrade: Sim. Queríamos trazer representações negras positivas e ainda não tão presentes no audiovisual. Na nossa série, não há espaço para os lugares-comuns limitantes e tantas vezes explorados, como bandidos, escravizados, empregadas, por exemplo. Nossos personagens são plurais, alegres, são protagonistas de suas histórias. São diversos dentro da diversidade. E os conflitos são universais, estão presentes em qualquer tipo de relação. Queríamos que pessoas negras, sobretudo, se identificassem, e para que isso acontecesse, perseguimos essas representações positivas.

O que falta para o Brasil ter mais narrativas negras não estereotipadas como é feito nos Estados Unidos?

Renata Andrade: Faltam oportunidades para mais pessoas negras em lugares de decisão e de poder. É fundamental que mais roteiristas, diretores, produtores negros ocupem esses espaços e tragam os seus repertórios, as suas vivências. Acredito que a partir do momento em que pessoas negras assumem essas posições e falam sobre assuntos que dominam, sobre aquilo que têm propriedade, nos distanciamos dos estereótipos. Sinto que esse movimento ganhou força, vejo algumas ações caminhando nessa direção, o que me anima, mas ainda é pouco. É importante dizer também que nós reivindicamos esses lugares de poder para que nossas narrativas tenham vez e voz, mas não queremos nos limitar. Queremos ter o direito de contar toda e qualquer história. O fator racial não deve, de maneira nenhuma, podar o nosso potencial criativo.

Thais Pontes: Acho que falta investimento e oportunidade para roteiristas negros. Por muito tempo, as narrativas negras eram contatos por outras pessoas que não eram nós, afinal, infelizmente, o mercado audiovisual ainda é majoritariamente branco, cis, classe média. O olhar sempre veio de fora. Muitas vezes, roteiristas negros eram colocados em salas de roteiro só para cumprir o papel da diversidade ou para ocupar a função de balizador de temáticas raciais. Isso é cruel, desgastante e muito triste. Acho que o mercado, aos poucos, está mudando. Claro que isso é fruto de muitos que vieram antes de mim, chutando portas e abrindo caminhos para que eu estivesse aqui hoje. Temos que reverenciar, agradecer e continuar pavimentando para que muitos outros venham. É fundamental dar espaço e confiar o poder da caneta nas nossas mãos para contar não só as narrativas negras, mas qualquer história que a gente quiser.

Quais os próximos passos de vocês na carreira?

Thais Pontes: O Encantado´s é um passo enorme na minha carreira. Assinar a criação de uma série na maior emissora do país é incrível e abre portas. A ideia é aproveitar essa visibilidade para consolidar meu trabalho. Eu e Renata temos muitas fagulhas de ideias sendo pensadas e um dos nossos grandes objetivos é escrever novela. Temos conversado bastante sobre isso. Espero que um dia role.

Renata Andrade:

Eu e a Thais temos conversado bastante sobre alguns projetos e temos alguns planos a médio prazo. Nossa meta principal como dupla é escrever uma novela e estamos cada vez mais animadas com isso.

 

 

 

 

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