Por que Julius e Rochelle de ‘Todo Mundo Odeia o Chris’ tem uma ligação tão forte e especial?

por | outubro 1, 2023

Os dois maiores medos de Rochelle Rock, matriarca da família na série “Todo Mundo Odeia o Chris”, resumem bem o que pode ser o temor central de muitas mulheres negras: Que os filhos se envolvam com tráfico de drogas e que o marido as troque por uma mulher branca. Esses medos se explicam nas vivências pessoais de suas mães, amigas, vizinhas, etc. Medo do abandono e solidão e medo de não conseguir fazer os filhos serem pessoas melhores do que elas julgam que se tornaram.

Julius, por sua vez, teme não conseguir sustentar a família. Trabalhando em dois empregos, às vezes três, um dos únicos pais presentes no bairro, demonstra seu afeto em atos de serviço. Ele entende que provar amor é garantir que sua família esteja segura financeiramente (ainda que nunca estejam).


Essas duas existências se complementam por saberem as razões do outro sem que se precise dar explicações. Pessoas negras, dentro de suas subjetividades, acabam passando por experiências comuns, muitas vezes impostas pela circunstância social existente. Os temores do casal se misturam, se complementam, se entendem, assim como os momentos de alegria são eufóricos e compartilhados (quem não lembra de quando eles compraram uma TV nova?).

Dentro do contexto histórico apresentado na série, toda narrativa teria de ser reconstruída se tivéssemos em tela um casal interracial. Não é uma crítica aos relacionamentos interraciais, mas apenas uma constatação sobre um aspecto da série que se espelha na realidade. Lembram do caso recente de racismo cometido contra uma influenciadora preta em que o namorado branco ficou parado com as mãos no bolso enquanto a moça estava chorando? Imaginam Julius agindo da mesma forma?

Outro ponto comum entre Julius e Rochelle é a consciência de suas condições de preto. Neusa Santos escreveu : “Ser negro é ser violentado de forma constante, contínua e cruel, sem pausa ou repouso por uma dupla injunção: a de encarnar o corpo e os ideais de Ego do sujeito branco e a de negar, recusar, anular a presença do corpo negro”. Aí reside a química inabalável de Julius e Rochelle. Eles sabem que para sobreviver, enfrentam a recusa dos brancos em aceitar uma família negra como digna de respeito e direitos.

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