Clínica odontológica afrocentrada expande para outras especialidades médicas

por | março 10, 2022

Dentista preto, médico preto, cliente preto. O sucesso do afroempreendimento Ayo Odontologia foi tão imediato que cresceu e, agora, virou Ayo Saúde. É representatividade, identidade, acolhimento. É felicidade, o significado de Ayo, nome de origem nigeriana.

Inaugurada em fevereiro de 2021, a clínica Ayo Odontologia conquistou rapidamente uma fiel clientela em busca de um atendimento afrocentrado. Funcionando no Centro do Rio de Janeiro (Av. Graça Aranha 416, sala 219), a clínica nasceu da necessidade de criar espaços seguros, humanizados e acessíveis para a população negra, com uma equipe formada por dez cirurgiões-dentistas.

A Ayo foi idealizada pelos dentistas Victor Hugo de Paula e Alexandre Severo Mendes, ambos formados pela Faculdade de Odontologia de Valença, no interior do Rio, que sentiram necessidade de ajudar colegas negros com dificuldades de encontrar ambientes confortáveis para pessoas pretas em carreiras elitizadas.

“A gente pensava em construir um espaço que fosse confortável para pessoas que se formaram, se dedicaram muito e começaram a perceber que o enorme desafio pela frente. É complicado para o profissional negro ter de provar que é bom o tempo inteiro, porque as pessoas, na maior parte das vezes, não têm confiança. A gente foge inteiramente do estereótipo. Por outro lado, percebemos também que pessoas pretas precisam de um cuidado específico da escuta, de entender seu histórico sem ser discriminado”, afirma Victor.

Desde a inauguração da clínica, a agenda sempre esteve cheia, o que indica uma necessidade bilateral por um espaço afrocentrado. Isso porque, na Ayo, as consequências do racismo na saúde física e mental do paciente são observadas, entendidas e levadas em consideração durante o tratamento. Muitos pacientes chegam com experiências de violência e racismo em ambientes odontológicos. O mito de que pessoas negras são mais resistentes à dor é uma das formas de racismo que frequentemente aparecem nos consultórios dentários. “O dentista fala ‘não, você é forte, você vai aguentar’, o que não procede, é um preconceito”, explica Alexandre.

Para quem se surpreende com esse tipo de preconceito, vale destacar que há estudos provando como a cor da pele do paciente influencia no tratamento oferecido. Numa pesquisa realizada pela Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul, de 2018, por exemplo, um grupo de dentistas foi confrontado com duas imagens, de um negro e de um branco, com o mesmo problema bucal, e o resultado mostrou que o paciente negro foi direcionado para tratamentos mais simples e baratos.

Isso se dá em todas as áreas da saúde. Daí, a necessidade de expandir o atendimento da Ayo. Além de todas as especialidades odontológicas – clínica geral, odontopediatria, cirurgia oral, implantodontia, próteses, ortodontia, ortopedia, dentística, periodontia, endodontia e harmonização orofacial –, a Ayo Saúde passa a oferecer atendimento nas áreas de ginecologia, pediatria, endocrinologia, dermatologia, cardiologia e clínica médica. A equipe agora conta com dez cirurgiões dentistas, sete médicos, uma auxiliar de saúde bucal e duas secretárias. Todos negros. É a Ayo Saúde voltada para a celebração da vida das pessoas pretas, saúde bucal e afro lifestyle. Não à toa, a equipe usa jalecos coloridos com estampas africanas, e adereços como turbante são bem-vindos, ao contrário da maioria das clínicas onde o acessório é proibido.

A residente de cardiologista Juliana Peres, coordenadora do atendimento médico na Ayo Saúde, também vivenciou o racismo em locais de trabalho. “Eu posso estar de jaleco, estetoscópio, com crachá de médica, mas sempre vai aparecer alguém achando que eu sou a técnica de enfermagem ou pedindo para eu limpar a sala”, diz Juliana, que é casada com Alexandre, um dos sócios da clínica.

Atualmente usando o cabelo crespo, a médica relata que também já foi vítima de comentários racistas a respeito dos fios. “Muitas de nós temos cabelo black, trança. Já cansei de ouvir ‘ah, mas de cabelo liso você fica tão mais arrumada'”, afirma. Por isso, os jalecos com estampa africana são também uma forma de ressaltar que a clínica é um espaço seguro para experienciar a própria cultura. “Aqui você pode ser quem você é, não precisa se esconder, não precisa alisar seu cabelo ou botar uma touca que não cabe na sua trança”, destaca Juliana.

Afroempreendimentos como a Ayo Saúde são fundamentais para a saúde física e mental de pessoas negras, e para o empoderamento financeiro delas. Além de contribuir para o combate das desigualdades sociais no país, onde negros são 56% da população.

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